Em 09/04/2024, a ANVISA apresentou defesa nos autos da Ação Civil Pública movida pelo IDEC (processo nº 5001408-12.2024.4.03.6100), na qual arguiu os motivos pelos quais editou a RDC nº 819/2023 para prorrogar o prazo para adequação das embalagens de alimentos, inicialmente conferido pela RDC nº 429/2020. Em síntese, seus argumentos foram os seguintes:
 

  1. Fato notório do impacto econômico resultante da pandemia de Covid-19 e da guerra da Ucrânia, que “(…) alterou o modo de consumo e exerceu impacto significativo no planejamento de compra e utilização das embalagens de alimentos (…)”.
  2. Impacto ambiental decorrente do possível descarte de 900 toneladas de embalagens oriundas de alimentos em condições sanitárias regulares, que representam cerca de 60 milhões de reais.
  3. A RDC nº 819/2023 seguiu o rito da edição de atos normativos “urgentes” e excepcionais, que admite a dispensa da Análise de Impacto Regulatório (AIR), Consulta Pública (CP) e Avaliação de Resultado Regulatório (ARR), conforme previsto pelo art. 38 e art. 39 da Portaria nº 162/2021. A urgência decorreu da iminência do fim do prazo de adequação da rotulagem e dos prejuízos e danos irreparáveis de difícil reparação relatados pelas inúmeras empresas do setor alimentício.
  4. Ao contrário do que entende a autora, a edição da RDC nº 819/2023 não teve motivação parcial, tampouco visou à defesa de interesses particulares de empresas, mas sim teve por finalidade minimizar os impactos econômico e ambiental decorrentes do descarte de 900 toneladas de embalagens. Não se trata, pois, de “favorecimento ilegal”, mas sim da “(…) preservação de milhares de postos de trabalho, contribuindo para que não se agravem os impactos da crise econômica vivida nos últimos anos por diferentes setores do País, em decorrência da pandemia e do contexto econômico internacional”. A existência de manifestações das empresas interessadas não torna parcial e escusa a edição da referida Resolução, pois, além de estar amparada em argumentos consistentes e ter observado processo administrativo válido, o endereçamento de requerimentos aos órgãos públicos decorre do legítimo direito de petição. Observa, nesse sentido, que “(…) trata-se de atribuição institucional da Agência avaliar e deliberar sobre pleitos de esgotamento de estoque solicitados por diferentes setores regulados”. E, por esse motivo, “a relevância no caso concreto não está relacionada à quantidade de pleitos de prorrogação que chegaram na Agência, mas à busca da melhor solução diante da equação risco x benefício envolvida”.
  5. Ausência de prejuízo ao direito à informação dos consumidores, uma vez que as informações nutricionais já constavam da rotulagem dos alimentos antes mesmo da edição da RDC nº 429/2020, sendo certo que a RDC nº 819/2023 somente implementou regras para tornar tais informações mais legíveis e visíveis, tendo esta Resolução apenas conferido prazo adicional para o esgotamento de rotulagens e embalagens de alimentos já adquiridas antes da vigência da RDC nº 429/2020, por um prazo máximo de 1 ano. Também não há prejuízo algum decorrente da coexistência de embalagens nos modelos antigo e novo, pois, tanto os alimentos quanto os rótulos, “(…) estão todos em condições sanitárias regulares e aptos ao consumo, inclusive no que diz respeito às informações obrigatórias na rotulagem, que, como já dito, já constavam das embalagens antes mesmo da RDC nº 429/2020”. 
  6. A aposição de etiquetas adesivas, contendo as regras da RDC nº 819/2023, nas embalagens antigas dos alimentos é inviável, pois, no caso de produtos resfriados ou congelados, a etiqueta necessitaria de uma tecnologia peculiar, para assegurar que seja indelével, mesmo sob umidade e baixas temperaturas, o que elevaria excessivamente os custos para a maioria das empresas.
  7. Aspectos formais do ato normativo: a escolha da Resolução de Diretoria Colegiada para veicular o tema da RDC nº 819/2023 tem por fundamento a Lei nº 9.782/99, art. 15 e art. 187 do Regimento Interno da ANVISA. Já a dispensa de Análise de Impacto Regulatório (AIR) encontra respaldo na Lei nº 13.848/2019, art. 6º, enquanto a dispensa de Consulta Pública (CP) e de Avaliação do Resultado Regulatório (ARR) estão previstas no art. 15 da Portaria ANVISA nº 162/2021.
  8. Ressalta a invasão do mérito administrativo pelo Judiciário, uma vez que “(…) o controle judicial sobre os atos técnicos da Autarquia deve ficar adstrito à legalidade, sem adentrar no mérito administrativo”.

ANVISA requer que a ação seja julgada improcedente, com a consequente revogação da tutela de urgência concedida e condenação da autora nas verbas de sucumbência.

No mesmo dia 09/10/2024, a ANVISA protocolou petição voltada a comprovar o cumprimento da tutela de urgência deferida pelo juiz. Para tanto, apresentou o Despacho nº 144/2024/SEI/GADIP/ANVISA, que encaminhou à GADIP o Despacho nº 49, publicado no Diário Oficial da União, em caráter de urgência, em 28 de março de 2024, pela qual deu ciência às empresas interessadas de que:

a) a RDC nº 819, de 09/10/2023, publicada no Diário Oficial da União – DOU nº 193-B, Seção 1, de mesma data, encontra-se com seus efeitos suspensos; b) a ANVISA deverá desde já abster-se de adotar medidas que, direta ou indiretamente, autorizem o descumprimento dos prazos de implementação da RDC nº 429, de 08/10/2020, de da Instrução Normativa – IN nº 75, de 08/10/2020; c) as empresas fabricantes de alimentos processados PUP, que estejam se valendo da autorização de esgotamento de embalagens e rótulos antigos pela RDC nº 819 nº 819/2023, deverão, num prazo máximo de 60 (sessenta) dias, que se encerra em 22/04/2024, adotar etiquetas adesivas complementares com a (c.i) nova tabela de informação nutricional e (c.ii) a lupa frontal “ALTO EM” em todos os rótulos e embalagens desconformes com a RDC nº 429/2020 e com a IN nº 75/2020”. 

Por fim, importante mencionar que, em 01/04/2024, a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais – FIEMG requereu sua admissão nos autos como amicus curiae, justificando que atende os requisitos de pertinência temática e interesse, por representar todo o setor industrial do ramo alimentício.

A FIEMG destaca que a RDC nº 819/2023 foi editada para minimizar os impactos da crise econômica vivenciada pelas indústrias alimentícias, em função do cenário de instabilidade econômica mundial, causado pela Pandemia do Covid-10 e pelo novo Coronavírus (Sars-Cov-2), que trouxe impactos bastante negativos às indústrias dos setores de alimentos e de embalagens, em especial pela queda da produção e venda e consequente aumento do estoque, bem como pela escassez de insumos e/ou matérias-primas.

Observa que as indústrias do ramo de sorvetes e gelados comestíveis sofreram impactos ainda mais sensíveis, até porque sua produção depende de fatores sazonais. Nesse sentido, entende a FIEMG que a decisão que suspendeu os efeitos da RDC nº 819/2023 e determinou a adequação dos rótulos dentro de um prazo de 60 dias, não levou em consideração as particularidades das indústrias do segmento de sorvetes e gelados comestíveis, resultantes dos efeitos sazonais – já que as alterações climáticas afetam o consumo de produtos – e da pandemia. Para essas indústrias, em especial, as despesas com rotulagem representam significativa parcela do custo operacional e, por consequência, do preço final dos produtos.

A FIEMG ressalta que, caso mantida a decisão, não restará alternativa a muitas empresas senão a inutilização das embalagens já fabricadas, o que resultará em um alto custo produtivo e um expressivo volume de resíduos sólidos que terão que ser descartados no meio ambiente.

Por fim, requer o deferimento do seu ingresso como amucis curiae e admitida apresentação de memoriais, realização de sustentação oral, participação em audiências e apresentação de todo tipo de documentos e estudos.